Vida e Saúde

Caso Afeganistão: Possíveis transtornos pós-traumáticos vivenciados pelas vítimas da tragédia

Um país em caos. Uma população amedrontada por terroristas do Talibã. Mulheres, homens e crianças sendo assassinados e perdendo a vida diante de um cenário de guerra e horror, motivado pela briga de poder e por religião. Relatos, imagens e vídeos desoladores, invadindo as redes e os canais de comunicação, mostrando como tem sido os últimos acontecimentos no Afeganistão. Impossível não nos preocuparmos, nos comovermos ou sentir empatia, ao testemunhar o radicalismo destruindo a paz, o amor e uma humanidade. A ira, o cerceamento à liberdade, os assassinatos em massa provocados por ideologias políticas e religiosas e que, sem sombra de dúvidas, mostram o retrocesso de todo um avanço mundial adquirido hoje pela ciência e tecnologia. Toda essa situação de dor imensurável nos faz refletir sobre a perda da felicidade, perda da vida e do ânimo de viver, além de uma completa devastação do equilíbrio mental, de indivíduos que vivem na pele as consequências irreversíveis do terror instalado hoje nas cidades afegãs.

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E quais as consequências para a saúde mental de um indivíduo que escapa ou sobrevive a uma situação conflituosa como essa? Primeiramente, vamos entender o que vem a ser um Transtorno Pós-Traumático. É um tipo de transtorno que se desenvolve após evento de natureza, excepcionalmente, catastrófica ou ameaçadora (o evento traumatizante), no qual o indivíduo começa a apresentar bloqueios ou dificuldades para desligar-se do acontecido. A vítima deste caos pode vir a apresentar sintomas irreversíveis, como:  humor reprimido, fuga de qualquer situação ou fato que possa remeter ao trauma ou ao cenário e imagens do ocorrido, reações exageradas ao estímulo, pesadelos e episódios de pequenos flashbacks que tragam à memória lembranças repentinas da ocorrência causadora deste trauma.

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Alguns sinais comportamentais podem ser evidenciados para caracterizar esse Transtorno que também pode ser chamado de Síndrome Pós-Traumática. São eles: Alterações comportamentais de agressão, gritos, hostilidade, isolamento social, irritabilidade, agitação, automutilação, comportamento autodestrutivo e hipervigilância. Também é possível detectar, em alguns casos, alterações de humor seguido por raiva excessiva, insistência na solidão, sofrimento emocional, desesperança, nervosismo, perda do prazer e do interesse em realizar determinadas atividades, ataques de pânico, culpa e descontentamento geral.

No caso dos sintomas psicológicos característicos deste transtorno podemos destacar a manifestação de episódios contínuos, ou não, de depressão, medo, desconfiança, alucinações e ansiedade em alto nível. Com extrema frequência esse paciente sofre com pesadelos, terror noturno, insônia, privação de sono, estresse agudo, dores de cabeça e desapego emocional. E em casos mais extremos, chegam a apresentar também pensamentos suicidas.

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Pessoas que vivenciam horrores como o que vem acontecendo no Afeganistão entram em um processo de revivescência que acaba desencadeando diversas alterações neurofisiológicas e também mentais. Os impactos negativos disto na vida do indivíduo passam pelo fato de que o mesmo estará sempre em alerta de medo, além de dar sinais de descontrole, pois as memórias do evento que causou o trauma, estão sempre vivas e não permitem que ele consiga ter uma vida harmoniosa e tranquila. A tendência é que a vítima se isole completamente do convívio das pessoas e passe a ter muitas dificuldades em desenvolver relacionamentos interpessoais saudáveis. Visto que, também pode estar mais suscetível a ataques severos de pânico e depressão profunda culminando em mutilações e suicídios. Outro fator predominante é que, em uma pequena proporção de casos, o transtorno pode apresentar uma evolução crônica durante numerosos anos e levar a uma alteração duradoura da personalidade.

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As manifestações do transtorno pós-traumático podem ocorrer em qualquer idade e os sintomas podem se iniciar entre semanas e meses após o evento desencadeante, geralmente nos primeiros três meses, mas durando além deste período. Em grande parte dos casos se torna crônico, principalmente quando não há acesso a tratamentos de qualidade. Pode ser subdividido em agudo, quando os sintomas duram de 1 a 3 meses após o trauma, e crônico, quando duram mais de 3 meses. Em alguns casos pode ter início protraído (após mais de seis meses do trauma), ou pode apresentar-se de maneira isolada ou, o que é mais comum, acompanhado de outros sintomas e transtornos psiquiátricos.

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Para quem tem a sorte e a felicidade de escapar do caos, o mais importante para o adequado tratamento é a detecção, com uso de questionamento direto e suspeição, já que grande parte das pessoas evita buscar ajuda devido aos sintomas gerais de isolamento e depressão.  Os resultados de revisões sistemáticas sugerem que a terapia focada no trauma é potencialmente benéfica na prevenção de sintomas pós-traumáticos crônicos, quando realizada nos primeiros seis meses após qualquer trauma ou violência.

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Enfim, o afeto, o acompanhamento intenso de um profissional de saúde mental aliado a uma possível intervenção medicamentosa, podem ajudar quem sobrevive a uma tragédia surreal como a ocorrida atualmente em terras afegãs. Sem dúvidas, a instauração do caos em uma nação sofrida pelos combates por política e religião que se arrasta por anos. Mas, não é fácil sair ileso mentalmente de uma guerra. Os danos mentais são devastadores. O principal é incutir no emocional do indivíduo, a confiança, a proteção e a segurança, perdidos em meio a tanta dor e tanta angústia. Uma rede de apoio de acolhimento, caracterizados por círculos de confiança, como a família ou amigos, também auxiliará na elevação da autoestima e da convivência saudável em ambientes de socialização. Ou seja, é preciso muito amor, muita compaixão e sabedoria para ajudar e acolher alguém que venha a sobreviver a essa vivência dolorosa e cruel, no sentido de trazer o sorriso de volta ao rosto, além de promover sintonia entre a mente e corpo, de forma equilibrada e saudável, para que assim, consiga minimizar os efeitos de um evento traumático e conflituoso ao qual viveu. O objetivo é apagar da memória as cenas de horror e não relembrar episódios fantasmagóricos e sangrentos de ameaça e tortura, que assombram e trazem tormenta ao inconsciente humano, alimentando doenças psíquicas e emocionais.

  • Dra. Andréa Ladislau Psicanalista
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